Assim como a comunicação publicitária, a comunicação pública mudou muito nos últimos anos e a internet ganhou um espaço muito importante, principalmente durante campanhas eleitorais. A mudança de comportamento dos eleitores no modo de consumir informação vem despertando a atenção de marqueteiros e estrategistas políticos. Fake news e deepfake já são termos comuns nesse cenário, por isso, seja em uma campanha eleitoral ou no dia a dia da comunicação pública, estar atento às principais tendências de comportamento é primordial para saber se comunicar com seu público.
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Para bater um papo sobre comunicação pública, a Mescla convidou o jornalista e sócio da Labox Comunicação Estratégica, Gustavo Moreno. Estrategista, o Gus atua em campanhas políticas e administrações desde 2002 e já participou de campanhas para todos os cargos, de presidente a vereador.
“Acredito que quanto mais você está exposto nas redes sociais, menos você está sujeito a sofrer com as fakes news, porque as pessoas começam a entender quem você é, quais os seus costumes, qual o seu perfil… quanto maior a proximidade, menor a porta de possibilidade das fake news“.
1- Há muito tempo, fazer comunicação pública vinha muito do olho no olho, do tradicional carro de som, das faixas na cidade… hoje sabemos que a internet ampliou essa comunicação, ao mesmo tempo que abriu um espaço maior pro diálogo (e críticas) entre gestor e população. Como trabalhar a comunicação pública nesse novo cenário?
Gus – Na verdade, eu acho que a internet é mais um veículo de comunicação que tem uma importância muito grande, mas que não é o único meio. Então se você voltar seus olhos apenas para a internet, você também pode estar cometendo um grande erro. Porque ainda existe a necessidade do carro de som, das faixas… e muitas vezes são elas que irão dar o impacto. Veja bem, da mesma forma que a internet chega para você alcançar essas pessoas, ela também pulverizou a audiência, então tem gente assistindo todo e qualquer tipo de material diferente no youtube ou nas redes sociais. Então é muito importante que você continue utilizando outros meios de comunicação para atingir também esse tipo de pessoa. Tem gente assistindo cada vez menos televisão, ouvindo cada vez menos rádio, escutando mais a rádio online, os aplicativos de música… ou seja, a audiência está pulverizada, então em uma cidade pequena, de interior, por exemplo, o outdoor continua sendo importante, o carro de som que passa em frente a casa continua sendo importante, o contato olho no olho… Eu costumo revelar como a história da comunicação. Começou lá atrás com o jornal, aí depois veio rádio, depois a televisão, chegou a mídia exterior e você tem a internet. Um não anula o outro. Conforme for surgindo novas ideias, novas possibilidades, elas não vão anular as outras. Então eu vejo a internet como uma ferramenta importantíssima, porém não dá pra você jogar toda sua atenção para ela. Ela não resolve tudo, até porque também tem suas partes ruins.
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2- Então falando dessas partes ruins agora… as fake news hoje são vistas como um grande problema na comunicação pública, nas campanhas políticas… Como lidar com esse problema que pode acabar com uma reputação de anos e até mesmo gerar grandes ruídos?
Gus – A internet, apesar dela te dar uma certa proximidade, muitas vezes você não sabe quem está do outro lado. E é aí que surgem as possibilidades de se criar perfis fakes, das pessoas estarem escondidas atrás de alguns perfis e da militância paga, que acaba indo lá fazer as críticas, que nem sempre são as críticas reais que a população está precisando, mas sim o que é de interesse da oposição, ou até mesmo para tirar o foco do gestor que está ali com a caneta na mão. Mas acredito que, quanto mais você está exposto nas redes sociais, menos você está sujeito a sofrer com as fakes news, porque as pessoas começam a entender quem você é, quais os seus costumes, qual o seu perfil… Então, para mim, quanto maior a proximidade do ente público com o cidadão, no dia a dia, mostrando o que está fazendo, como uma espécie de blogueiro mesmo, menor as chances de uma fake news se propagar. Até porque quando a pessoa vê já pensa: “ah não isso é mentira, eu tava vendo nas redes dele…”. Então uma forma de lidar com esse problema é essa, se aproximando mais. Quanto maior a proximidade, menor a porta de possibilidade das fake news. Agora, uma solução definitiva para isso seria a regulamentação das notícias. Acredito eu, enquanto jornalista formado, que foi uma grande perda lá atrás terem acabado com a obrigatoriedade do diploma para o jornalista, porque da mesma forma que hoje o facebook e o instagram, quando você vai fazer uma campanha política, lhe obrigam a fazer um cadastro daquele político para eles identificarem quem são figuras políticas, daria para eles identificarem quem são os jornalistas. E toda informação, toda notícia, deveria ter nas redes sociais alguém assinando. Assim, quando você visse uma notícia nas redes sociais que não tivesse um jornalista assinando, essa notícia, automaticamente, já seria vista como uma notícia suspeita. Mas a partir do momento que tiver alguém assinando, um selo ou número de registro identificando o profissional, você já bloqueia, porque se eu estou assinando determinada matéria eu sou responsável por ela e posso sofrer qualquer tipo de ação, inclusive nas redes. Então não acho que seja uma questão de censura, mas uma questão de regulamentação, de controle.
3- Redes sociais, vilãs ou mocinhas na comunicação pública? Como você enxerga isso e qual a melhor maneira que os gestores e políticos têm de usar essas ferramentas hoje em dia?
Gus – Eu acredito muito na transparência e na proximidade, na vida real mesmo, vida de blogueiro. É aquela coisa, as pessoas querem participar do seu dia dia. O que mais tem audiência na tv brasileira são as novelas. Se é uma obra na educação, conta cada passo dessa obra, quando assinar o contrato, quando for pra Brasília cobrar recursos, mostra como a obra está ficando… Então vai contando as histórias de várias ações que você está tocando simultaneamente. Eu não acho que as redes sociais sejam vilãs, acho que são os vilões que tentam destruir as reputações e as redes sociais. Mas se você tiver um canal aberto, muito próximo da população, você evita que isso aconteça dizendo onde está, o que está fazendo, o que está assinando, com quem está conversando… Enfim, para você ter câmera aberta por mais tempo. Isso funciona para os blogueiros, não é? Por que não funciona para os políticos também? Então eu acho que é a proximidade. Quanto mais se expor nas redes sociais, menores são as chances de tomar os venenos dos vilões. Sua imagem fica mais consolidada.
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4- Se você pudesse eleger 3 ações que uma comunicação pública não pode deixar de fazer, quais seriam?
Gus – Uma é ter profissionais e empresa capacitados para cuidar da comunicação, porque são as empresas e os profissionais que entendem e tem experiência para fazer esse mix de comunicação e estão sempre antenados e atualizados nas novas tendências, nas modificações que acontecem nas redes sociais, ou na nova empresa de carro de som, ou a rádio que mudou de dono… Enfim, a gente está sempre antenado, então acho que esse é o primeiro passo. O segundo passo é o entendimento, por parte dos gestores, da importância da comunicação continuada. Muitos gestores estão acostumados a só fazer comunicação na época de eleição e acho que isso está funcionando cada vez menos. O dia a dia é muito importante, e é preciso que ele entenda a necessidade dessa comunicação diária, constante, dessa proximidade. E a terceira ação, eu acredito que seja gestão mesmo. Acho que não existe comunicação se não existir produto. Se você tem uma boa gestão, tiver respondendo aos anseios da população, a comunicação vai apenas, digamos assim, lacrar isso aí. Eu acho que esse tripé funciona bem: ter bons profissionais de marketing, de publicidade e ter empresas capacitadas; o gestor entender entender que é preciso fazer uma coisa contínua, que precisa ter investimentos, mobilizar um tempo da sua agenda para isso; e o terceiro é gestão. Talvez não nessa ordem, mas talvez a gestão venha primeiro, porque ela é a matéria-prima da comunicação. Hoje a gente costuma ver mais gestão que funciona no bate-pronto: “olha tem um problema ali, vamos resolver”, mas não, eu acho que tem que ser uma coisa mais gestão, pensar em ações de curto, médio e longo prazo, pensar ações grandes, e isso é que vai gerar a matéria-prima para a comunicação ser feita, é o que de fato vai dar resultado. A população sentir a ação efetiva da prefeitura e quando entrar a comunicação vir mais como um reforço, uma lembrança, uma prestação de serviço, informação à população de um novo serviço, de uma nova unidade de saúde, uma rua asfaltada, limpeza urbana.